Após alguns projetos de prevenção ao uso de drogas, com diversas turmas, registrei mais de 700 perguntas feitas por alunos entre 13 e 15 anos sobre as drogas. E o resultado foi muito interessante. Onze perguntas mais frequentes que nos permitem entender melhor a forma que eles pensam o tema.
1) “É possível usar droga sem ficar viciado?”
Esta pergunta aparece com uma frequência impressionante. Ela aponta para o conflito do jovem entre a curiosidade e o medo do vício. Eles querem saber qual seria o limite para usar sem riscos. Qual tipo de droga permite isso, qual a frequência de uso, se a idade influencia e se só experimentar faz alguma coisa.
Algumas variáveis desta pergunta são “fumar maconha uma vez, só para experimentar, vicia?”, “as pessoas que usam por um pequeno tempo, todas viciam?”, “há algum tipo de alucinógeno que não cause dependência?”.
A mensagem é clara: “tenho vontade de experimentar”.
Nesses casos, é difícil eliminar a curiosidade existente. O objetivo é adiar ao máximo a experimentação, apresentando a idade como um fator crucial para a chance de “vício”. Quanto mais tarde experimenta, menor a chance. Se eles conseguirem esperar, provavelmente a curiosidade vá desaparecendo com o tempo.
2) “Como, quem e onde vão me oferecer drogas e como dizer não?”
Esta pergunta aparece na mesma frequência da anterior e contrasta completamente com ela. Demonstra a preocupação em estar preparado para não entrar nessa quando surgir a oportunidade.
Algumas variáveis dessa pergunta são “como posso me preparar para não usar?”, “como resistir à pressão dos outros?”, “como agir diante de amigos que se drogam?”.
Para isso, uma ótima opção é levá-los a simular situações (ver dinâmicas sugeridas) em que tenham que recusar a droga de um amigo. Isto os leva a criar alternativas e a refletir sobre elas. Outro ponto importante é bater constantemente na tecla de que eles devem se afastar de colegas usuários, o que é um ótimo comportamento preventivo.
3) “Você já usou drogas?”
O interesse dos adolescentes pela experiência pessoal do adulto que está falando sobre drogas também é algo muito frequente e vem na forma de perguntas diretas e sem rodeios.
Dois conselhos: deixe para falar sobre isso nos últimos encontros e fale sempre a verdade.
Deixar para responder depois gera uma curiosidade que, de certa forma, motiva os alunos e parece que contribui para o vínculo com eles. E a verdade da sua experiência sempre pode ser produtiva, desde que seja dita de forma a focar e a sustentar a mensagem que você quer transmitir.
4) “Qual é a sensação de usar? Que tipo de alucinações a pessoa tem?”
Novamente a curiosidade. Atribuo isso em grande parte à publicidade que gira em torno da droga, tanto por parte de usuários e traficantes, quanto por parte dos profissionais, ao atribuírem superpoderes às drogas (tanto para o lado bom quanto para o lado ruim).
Esta supervalorização das drogas cria uma aura de fascínio em torno delas, que pode ser bastante atraente para alguns jovens. É importante saber que muitas pessoas que experimentam maconha ou alucinógenos se sentem mal e criam certa aversão à sensação gerada.
Para contrapor a publicidade positiva, esta animação demonstra bem o que acontece e vai acontecendo com a sensação da droga.
5) “É verdade que a maconha faz menos mal que o álcool e que o cigarro?”
Aqui chegamos ao âmago da mensagem publicitária da maconha, que está cada vez mais impregnada na mente dos jovens. As variáveis desta pergunta se referem principalmente à questão da “maconha medicinal”.
“Maconha medicinal é prejudicial à saúde?”, “Dizem que maconha faz bem à saúde, isso é verdade?” são perguntas que contém a principal ideia publicitária da maconha: “é natural, é a menos prejudicial das drogas, praticamente inofensiva”. Mensagem que favorece muito o início precoce do consumo.
Para esta questão é importante ampliarmos a discussão para aspectos que vão além da saúde, tais como a família, o círculo de amigos, a escola, os valores e os sonhos de cada um.
6) “Qual é a pior droga? A mais forte, destrutiva e viciante?”
Esta pergunta, extremamente comum, remete ao prazer que muitos têm em ouvir histórias de terror, em “ver sangue”, em se impressionar com coisas macabras.
Como falar sobre o crack ou o krokodil não é muito proveitoso para a prevenção de drogas nesta idade, este tipo de pergunta pode ser aproveitada para falar sobre tolerância.
A tolerância é percebida quando o corpo tem a sensação de já estar preparado para alguma droga, tendo poucos efeitos colaterais. A droga para a qual o seu corpo tem mais tolerância, ou seja, aquela a que ele se adapta bem, que gera uma sensação boa de primeira, é a droga que mais provavelmente vai te prender. Esta é a pior droga. Para você.
7) “Como é feito o tratamento de uma pessoa viciada em uma clínica de recuperação? Antes, durante e depois?”
Eles querem saber se o caminho das drogas tem volta, se fica alguma sequela, o que leva o dependente a se tratar, como é esse tratamento.
Normalmente não entro neste tema com os jovens, por não saber como dar muita utilidade para as respostas a estas perguntas. Uma coisa que enfatizo é o caminho de perdas percorrido pelos usuários até eles entrarem em crise, seja por excesso de perdas ou por uma perda muito grande, quando eles decidem se tratar. Aí inicia o processo de recuperação.
8) “Como ajudar alguém próximo a nós a se livrar das drogas?”
Normalmente esta pergunta é acompanhada da declaração de que um amigo ou parente usa drogas. Como ajudá-lo?
Esta é uma boa oportunidade para reforçar a mensagem de que o melhor a fazer é se afastar de colegas usuários e comunicar a escola, os pais ou algum adulto que possa fazer alguma coisa. É legal levá-los a compreender que a crise é o que faz o sujeito mudar e que eles podem contribuir para gerá-la antes que a própria droga a gere.
Quanto a familiares, é um tema mais delicado. Pode ser conversado individualmente se houver espaço.
9) “O que passa na cabeça de um drogado?”
Esta pergunta compreende variações do tipo “por que alguns ficam agressivos?”, “por que muitos só relatam o lado bom?”, “como eles veem o mundo?”.
Muitos dos exemplos dados por eles neste tipo de pergunta dão a entender a preocupação com a falta de controle advinda do uso de drogas. E é importante reforçar esta ideia, de que as drogas vão “pondo para dormir” o lado bom da consciência dos usuários e eles perdem a noção do que fazem.
No livro Por Trás da Aparência Singela de Mãe tem um capítulo só sobre a psicologia do dependente químico, para quem quiser entender melhor estas questões.
10) “De onde as drogas vêm? Como são feitas?”
A mente inquisitiva dos jovens quer saber a origem destas coisas sobre as quais é falado tão mal e como elas chegam a se tornar pó, cigarro ou pedra para serem usadas.
Boa oportunidade para mostrar que a maioria das drogas se origina de plantas, contribuindo para desacreditar o mito de que “a maconha é natural e, se é natural, então não faz mal”. A cocaína vem de uma planta, a heroína vem de uma planta, o cigarro vem de uma planta, o baseado vem de uma planta. A única coisa que podemos concluir disto é que o fato de uma droga se originar de uma planta não quer dizer nada sobre os danos que pode causar.
Como são feitas? Bom, aqui dá facilmente para gerar um pouquinho de nojo nos alunos com relação ao processo de fabricação das drogas.
11) “O que leva uma pessoa a usar drogas?”
Finalmente, nesta pergunta estão muitos dos alunos indignados com o fato de que mesmo sabendo que é prejudicial, as pessoas ainda buscam as drogas.
É curioso observar nas discussões em sala que muitos deles associam o início do uso à “depressão”, como eles falam. Existe um imaginário de que os problemas de uma pessoa a levam a buscar as drogas.
Neste aspecto é importante demonstrar o quanto o grupo também influencia o início do uso e, novamente, bater na tecla de que uma ótima forma de prevenir-se é manter distância de usuários.
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